domingo, 3 de fevereiro de 2008

As Máscaras

As máscaras estão presentes há muito tempo conosco, cada um tem a sua; sendo elas apenas um artefato para simples fantasia ou uma falha de caráter, onde dependendo do caso, é quase uma segunda pele.
Como o blog é bem eclético, e procura deixar em voga, assuntos interessantes para os curiosos de plantão, e principalmente para satisfazer os devaneios de minha idiossincrasia diferenciada, estará a disposição o artigo a seguir:

Máscaras - As Mil Faces de Deus
Por Paulo Urban
Publicado na Revista Planeta nº 362 / novembro 2002


Enigmáticas, inquietantes, trágicas ou cômicas, assustadoras ou belas, as máscaras compõem um extraordinário acessório de formas e funções múltiplas, cujas origens se perdem na noite universal dos tempos. Simples ou complexas, articuladas ou imóveis, antropomorfas, zoomorfas ou híbridas, feitas de folhas, de cascas e de ramos vegetais ou de tecido, de pele ou de couro, de madeira, de conchas, forjadas em ouro, prata ou outros metais, esculpidas em pedra ou cozidas em cerâmica, moldadas em papel etc, as máscaras são artefatos omnipresentes que espelham as sociedades que as engendram.
Sua ocorrência é de tal ordem diversificada que, desde os primórdios
da humanidade, pelos cinco continentes encontramos variações de seu
uso que chegam quase ao infinito. Remarquemos ainda que mesmo os
povos primitivos que ignoraram os mais simples utensílios e
ferramentas e que prosperaram sem sequer conhecer a roda, fabricavam
suas máscaras para usá-las num contexto ritualístico e sagrado.
Estudos antropológicos e descobertas arqueológicas feitos a partir
do século 19 atestam serem as máscaras mais difundidas pelo mundo do
que o arpão, a alavanca e o arado.
A primeira máscara de que se tem registro está gravada, entre centenas de outras figuras, na caverna labirinto de Trois Frères, em Ariège, nos
Pirineus, datada do Paleolítico Superior (30.000 a 10.000 a.C.),
descoberta em 20 de julho de 1914. Com a eclosão da I Grande Guerra dali a um mês, seu estudo só pôde ser iniciado pelo abade Henri Breuil em 1918. O arqueólogo interpreta a imagem rupestre do feiticeiro barbudo, cujas pernas são de homem e cujos membros dianteiros são de urso, como um xamã antropozoomórfico que, usando máscara de cervo, preside um ritual de cura e caça, associado à fertilidade.
Etimologicamente, o termo máscara tem origem controversa. Para uns procede do italiano maschera que, no século XIV, se constituiu sobre a forma anterior mascara. Originalmente, estaria relacionada ao baixo latim mediterrâneo masca, cujo sentido era o de "demônio" e que no século VII assume a acepção de "bruxa ou feiticeira", que se transferiu ao francês occitânico. Para outros, o termo maschera introduziu-se na Itália a partir das invasões árabes, sendo corruptela de mashara, a significar "personagem bufão", por sua vez derivado do verbo sahir, que quer dizer "ridicularizar".
Dentre as inúmeras funções das máscaras está a de reanimar os mitos que sustentam os costumes sociais; por meio de seu uso os homens cumprem seus ritos cosmogônicos e tomam consciência de seu lugar no universo.
Compreendamos melhor essa relação nas palavras do
etnólogo Claude Lévi-Strauss: “Animada por seu portador, a máscara
transporta a divindade até a Terra, ela revela sua realidade e a
mistura à sociedade dos homens; inversamente, quando se mascara, o
homem atesta sua própria existência social, manifesta-a, codifica-a
à custa de símbolos. A máscara é a mediadora por excelência entre a
sociedade e a natureza, e a ordem sobrenatural subentendida.”
Portanto, cumpre ressaltar, as máscaras se revestem de um poder
mágico especial; por meio delas podemos ter acesso ao mundo
invisível e, por isso, não são inócuas. A máscara e seu usuário se
alternam e se mesclam numa só (inter)face; estabelece-se assim, por
intermédio dela, uma ponte onde supostamente se condensa a força
vital capaz de apoderar-se daquele que se coloca sob sua proteção. Máscaras são, destarte, instrumentos de possessão. ... continua...

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